Comunicação e o modelo educacional

Publicado por Leonardo Dias em

Fisioterapeutas e profissionais da área de saúde, vocês já pararam para pensar no poder das palavras? Vocês já fizeram uma análise do efeito que uma conversa pode ter em nossos pacientes?

 

Estamos constantemente trabalhando com pessoas que, na maioria das vezes, estão se sentindo fragilizadas, com dor, e que buscam em nós uma estratégia de recuperação. Hoje sabemos da importância do componente educacional para o sucesso do tratamento de nossos pacientes. A linguagem utilizada durante a comunicação tem um papel muito grande na reabilitação e, nesse aspecto, encontramos diversas falhas de comunicação e interpretação entre terapeuta e paciente.

 

Pesquisas recentes sobre o assunto demonstram que um dos maiores problemas é a dificuldade que os pacientes apresentam em entender o que o profissional de saúde diz (Cedraschi et al., 1998). Outro problema é a terminologia técnica utilizada e os modelos apresentados pelos profissionais da área médica (Glenton, 2002). Não existe um consenso sobre a metodologia mais apropriada para abordar o paciente e, muitas vezes, há uma dificuldade de entendimento entre os próprios profissionais. Esses fatores dificultam o desenvolvimento de pesquisas, pois falta padronização de terminologia e linguagem de comunicação entre o paciente e o profissional de saúde.

 

Em uma pesquisa desenvolvida na Inglaterra (Barker et al., 2009), os pesquisadores avaliaram como os pacientes com dor lombar interpretaram as informações que receberam dos terapeutas, fisioterapeutas, quiropraxistas e osteopatas, assim como os efeitos que essas informações poderiam causar no comportamento dos pacientes. Nesse estudo foram identificados alguns componentes causadores das falhas de comunicação, por exemplo: uso de jargões, gírias e metáforas podem oferecer diferentes interpretações, em que ambos os lados acreditam estar falando sobre o mesmo assunto, porém, a grande maioria dos pacientes tem uma interpretação diferente da que o profissional acredita estar transmitindo; utilização de um modelo médico ao invés de um modelo específico para educar o paciente leigo somado a falta de capacidade do profissional em educar o paciente de maneira eficiente; falha de entendimento entre os profissionais da saúde; múltiplos sistemas de classificação para a dor lombar e utilização de terminologia sem uma padronização, baseando-se em experiência profissional, pessoal e hábitos do profissional (Barker et al., 2009).

 

Durante o estudo, os pacientes foram questionados a respeito da abordagem dos profissionais de saúde. Além disso, questionou-se como o significado de algumas palavras referentes a dor lombar, comumente utilizadas na comunicação, foram interpretadas. Dentre várias palavras e termos descritos, alguns chamaram mais a atenção:

 

“Não-específico”: grande parte dos pacientes interpretou esse termo como se o profissional não soubesse a causa do problema e, consequentemente, não soubesse o que fazer. Alguns pacientes interpretaram como “não-existente”, demonstrando que é um problema psicológico, enquanto que outros pacientes acreditaram que “não-específico” significa que a origem da dor é diferente do local da dor.

 

“Agudo”: para alguns pacientes, “agudo” significa que é menos dolorido do que crônico. Uma minoria interpretou “agudo” como recente ou recorrente e a maioria interpretou como algo grave.

 

“Crônico”: para a maioria dos pacientes uma dor crônica significa muito grave, enquanto que outros acreditam ser um problema sem solução.

 

“Recorrente”: foi interpretado como menos grave, com uma característica de dor que vai e volta. Comparou-se com a dor crônica que nunca vai embora.

 

“Musculatura fraca”: muitos acreditaram que o termo foi utilizado por falta de exercícios e movimentos, enquanto outros acreditaram que foi por causa de uma alteração permanente e progressiva.

 

“Instabilidade”: foi interpretado pela maioria como algo instável e permanente, e que, se a pessoa relaxar, vai sair do lugar.

 

“Envolvimento neurológico”: poucos interpretaram que o problema tinha envolvimento dos nervos. A maioria interpretou como um problema na cabeça e no cérebro, algo gravíssimo e com eminência de morte.

 

“Nervo pinçado”: inúmeras interpretações foram percebidas, como nervo preso entre o osso e o disco, inflamação, mais grave, menos grave, etc.

 

“Desgaste”: interpretou-se como se fosse sair do lugar com o tempo ou durante uma atividade. Assim como se estivesse desintegrando, degenerando.

 

“Artrite”: foi interpretado como algo grave, incurável, progressivo, especialmente para jovens, e como uma inflamação das articulações.

 

A questão que devemos analisar é que, na maioria das vezes, mesmo com boas intenções, o profissional da saúde falha em transmitir a informação e educar o paciente. Utiliza-se, então, uma abordagem ineficiente, não atualizada e uma linguagem inapropriada.

 

Uma estratégia interessante é a de pedir ao paciente se ele pode explicar, com palavras próprias, qual foi o entendimento sobre o problema apresentado. Uma outra solução seria a de pedir para o paciente explicar o que ele entendeu sobre o que o médico disse a respeito do diagnóstico e sobre os exames realizados. E, por último, o que ele dirá para a família sobre o seu problema. Essas simples questões podem ajudar o fisioterapeuta a estabelecer o grau de entendimento do paciente, assim como uma forma de direcionar a melhor abordagem educacional para cada paciente.

 

Em suma, devemos focar na utilização de modelos educacionais mais eficientes, somado a uma melhor padronização dos métodos de avaliação, diagnóstico e tratamento que estão de acordo com as evidências científicas atuais.

 

Leonardo Dias

Equipe Fisio na Pauta

 

Como citar esse artigo:

Santos, L.C.A.D. (2017). Comunicação e o modelo educacional. Retirado de: https://fisionapauta.com.br/comunicacao-e-o-modelo-educacional/

 

Referências Bibliográficas:

 

Barker, K. L., Reid, M., & Lowe, C. J. M. (2009). Divided by a lack of common language? – a qualitative study exploring the use of language by health professionals treating back pain. BMC musculoskeletal disorders, 10(1), 123.

 

Cedraschi, C., Nordin, M., Nachemson, A. L., & Vischer, T. L. (1998). Health care providers should use a common language in relation to low back pain patients. Baillière’s clinical rheumatology, 12(1), 1-15.

 

Glenton, C. (2002). Developing patient ‐ centred information for back pain sufferers. Health Expectations, 5(4), 319-329.

 


2 comentários

Wilter Oliveira Rezende · 22/06/2017 às 10:05

Excelente texto!!!

Esta é uma preocupação que todos deveriam ter… Acredito que o sucesso profissional principalmente de quem trabalha na área de saúde advenha de conhecimento técnico, meios de desenvolvimento deste conhecimento técnico e “vontade de melhorar do pcte”. Neste contexto a comunicação entre profissional e pcte se tornar fundamental…

Parabéns ao Fisioterapeuta Leonardo Dias pela abordagem ao tema.

    Leonardo Dias · 28/06/2017 às 17:13

    Olá Wilter, obrigado pelo comentário. Seja muito bem-vindo ao Fisio na Pauta.

Deixe um comentário

Espaço reservado para avatar

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

18 − seis =