Mudar é preciso!
A Fisioterapia está passando por uma mudança de paradigma ao que se refere à educação do profissional e o relacionamento com seus pacientes. O conceito de “mudança de paradigma” foi criado pelo filósofo Thomas Kuhn (1962) em sua obra “A Estrutura das Revoluções Científicas”. O filósofo sugere que teorias são “pacotes de ideias”, denominados “paradigmas” (Kuhn, 1962). Para Kuhn (1962), a ciência evolui através de sucessivas aceitações e mudanças de paradigmas. Esse processo caracteriza a “revolução científica” do século XX (Kuhn, 1962). Nesse sentido, estamos presenciando uma “revolução científica” no modelo de educação na área musculoesquelética e no tratamento da dor.
Deixa eu explicar isso melhor.
O modelo educacional mais utilizado em reabilitação musculoesqueléticas é denominado “modelo biomédico”. Esse modelo é centrado em parâmetros anatômicos, biomecânicos e patofisiológicos e vem sendo utilizado com sucesso no tratamento de lesões agudas. Entretanto, o modelo biomédico tem demonstrado eficiência limitada no alívio da dor e na melhora da incapacidade física em condições complexas e persistentes, em que a dor está associada às alterações do sistema nervoso central, imunológico e endócrino (Louw at al, 2016).
Grande parte dos fisioterapeutas que atuam na área de reabilitação musculoesquelética e que foram educados de acordo com o modelo biomédico, acreditam que as dores musculoesqueléticas crônicas estão relacionadas às instabilidades da coluna lombar, postura e técnicas incorretas de levantamento de peso, entre outros fatores (Holden et al. 2009; Darlow et al. 2012). Essas crenças limitam os fisioterapeutas a seguirem as evidências científicas para o tratamento de dores musculoesqueléticas crônicas. Consequentemente, técnicas de tratamento passivo são utilizadas e atividades físicas e laborais do paciente são limitadas. Essas medidas estimulam o comportamento de medo e recusa da prática de atividade física por parte dos pacientes (Holden et al. 2009; Darlow et al. 2012).
Fortes evidências demonstram que a educação do fisioterapeuta influencia as crenças de seu paciente em relação às dores musculoesqueléticas (Holden et al. 2009; Darlow et al. 2012; Lakke et al. 2015). Dessa forma, há um comprometimento do sucesso do tratamento fisioterapêutico, uma vez que esse tipo de educação estimula o medo de movimentar-se, a ansiedade e o estresse (Louw et al. 2016), a auto-percepção negativa e dependência do tratamento (Traeger et al. 2017).
A mudança desse paradigma está em progresso e espera-se que o modelo biopsicosocial seja adotado e implementado na educação do fisioterapeuta e no tratamento do paciente nos próximos anos (Jull, 2017). O modelo biopsicosocial foi introduzido por Engel (1977). O autor argumenta que o modelo biomédico é reducionista e que as dimensões comportamentais, psicológicas e sociais do paciente devem ser consideradas para melhor entender suas condições médicas (Engel, 1977). Esses novos “pacotes de idéias”, advindas de novas evidências ciêntificas quanto ao uso do modelo biopsicosocial, demonstram maior eficiência na diminuição da dor, da incapacidade física, da “catastrofização” da dor e nas limitações funcionais (Louw et al. 2016).
No Brasil, é importante destacar a contribuição científica de DeSantana et al. (2017) e da Comissão de Fisioterapia da “Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor” os quais publicaram recentemente o artigo entitulado “Currículo em dor para graduação em Fisioterapia no Brasil”. A obra propõe um novo curriculum para a graduação em Fisioterapia, incluindo o estudo e educação da dor, destacando a “construção de uma relação terapêutica com o paciente, favorecendo a autonomia e educação do paciente, além de estratégias para avaliação e manuseio da dor” (DeSantanna et al, 2017, p. 72).
Segundo Nijs et al. (2013), os fisioterapeutas devem se conscientizar do impacto de suas atitudes e de suas crenças em relação ao seus pacientes, pois essas estão diretamente relacionadas à adesão ao tratamento e seus resultados. Está na hora de você também, querido leitor, mudar seus paradigmas, aceitar as evidências ciêntíficas mais atuais e entender que o modelo biomédico tradicional, além de ser pouco eficaz, pode estar trazendo malefícios ao seu paciente.
O Fisioterapia evolui e você?
PS: Para saber mais sobre a Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor (SBED) acesse:
http://www.sbed.org.br/home.php
Caso queira mais informações e evidências sobre a utilização do modelo biopsicosocial no tratamento da dor, visite o site:
Pesquisa em Dor (PED) – http://pesquisaemdor.com.br
Escute o episódio 002 do Fisio na Pauta Podcast
Equipe Fisio na Pauta
Como citar esse artigo:
Lopes, H. (2017). Mudar é preciso! Retirado de: https://fisionapauta.com.br/mudar-e-preciso/
Referências Bibliográficas:
Darlow, B., Fullen, B. M., Dean, S., Hurley, D. A., Baxter, G. D., & Dowell, A. (2012). The association between health care professional attitudes and beliefs and the attitudes and beliefs, clinical management, and outcomes of patients with low back pain: a systematic review. European Journal of Pain, 16(1), 3-17.
DeSantana, J. M., Souza, J. B. D., Reis, F. J. J. D., Gosling, A. P., Paranhos, E., Barboza, H. F. G., & Baptista, A. F. (2017). Currículo em dor para graduação em Fisioterapia no Brasil. Revista Dor, 18(1), 72-78.
Engel, G. L. (1977). The need for a new medical model: a challenge for biomedicine. Science, 196(4286).
Holden, M. A., Nicholls, E. E., Young, J., Hay, E. M., & Foster, N. E. (2009). UK‐based physical therapists’ attitudes and beliefs regarding exercise and knee osteoarthritis: Findings from a mixed‐methods study. Arthritis Care & Research, 61(11), 1511-1521
Jull, G. (2017). Biopsychosocial model of disease: 40 years on. Which way is the pendulum swinging?. British journal of sports medicine.
Kuhn, T.S. (1962). The Structure of Scientific Revolutions. Chicago, IL: University of Chicago Press.
Lakke, S. E., Soer, R., Krijnen, W. P., van der Schans, C. P., Reneman, M. F., & Geertzen, J. H. (2015). Influence of Physical Therapists’ Kinesiophobic Beliefs on Lifting Capacity in Healthy Adults. Physical therapy, 95(9), 1224.
Louw, A., Zimney, K., Puentedura, E. J., & Diener, I. (2016). The efficacy of pain neuroscience education on musculoskeletal pain: A systematic review of the literature. Physiotherapy Theory and Practice, 32(5), 332-355.
Nijs, J., Roussel, N., van Wilgen, C. P., Köke, A., & Smeets, R. (2013). Thinking beyond muscles and joints: therapists’ and patients’ attitudes and beliefs regarding chronic musculoskeletal pain are key to applying effective treatment. Manual therapy, 18(2), 96-102.
Traeger, A. C., Skinner, I. W., Hübscher, M., Lee, H., Moseley, G. L., Nicholas, M. K., … & Hush, J. M. (2017). A randomized, placebo-controlled trial of patient education for acute low back pain (PREVENT Trial): statistical analysis plan. Brazilian Journal of Physical Therapy.
1 comentário
Curso de auriculoterapia · 18/09/2020 às 16:00
Sou a Fernanda Almeida, e quero parabenizar você pelo seu artigo escrito, muito bom vou acompanhar o seus artigos.